Será que é mão de obra ruim… ou negligência do gestor?


Um papo reto sobre defeitos e erros grosseiros em obras residenciais

Por Weliston

Quando surgem rachaduras, infiltrações que nunca secam ou aquele piso que estufa poucos meses depois da entrega, a reação quase automática é apontar o dedo para a construtora:

“A obra é uma droga.”

E muitas vezes é mesmo.
Mas a pergunta incômoda — e necessária — é: será que sempre é só obra mal feita?
Ou existe uma falha igualmente grave, porém menos debatida: a negligência do gestor da obra (dono, síndico ou fiscal)?

Vamos falar disso sem rodeios.


O que costuma aparecer nas obras (e o que isso significa)

As patologias mais comuns em edificações residenciais se repetem como um roteiro conhecido:

  • Fissuras e rachaduras em paredes e lajes

  • Infiltrações persistentes e umidade crónica

  • Descolamento ou delaminação de revestimentos

  • Falhas graves de impermeabilização

  • Problemas elétricos e sobrecargas

Esses problemas não surgem do nada. Normalmente são sintomas de:

  • Projetos mal dimensionados

  • Execução fora dos padrões técnicos

  • Uso de materiais inadequados ou substituídos

  • Falta total de manutenção ou acompanhamento técnico

📌 Estudos técnicos sobre patologias em edificações mostram que umidade e falhas de impermeabilização estão entre as maiores causas de danos recorrentes — e também das mais caras de corrigir.


Existe norma — então por que o problema continua?

No Brasil, temos a NBR 15575 — Norma de Desempenho, que estabelece critérios mínimos de qualidade, segurança, conforto e durabilidade das edificações.

Na teoria, ela deveria orientar:

  • Projetos

  • Materiais

  • Execução

  • Vida útil dos sistemas construtivos

Na prática?
A aplicação técnica da norma e a fiscalização variam muito. Quando a NBR não é respeitada, os defeitos costumam aparecer mais cedo do que o esperado — e quase sempre com alto custo de correção.


Pressão por prazo e custo: o contexto que agrava tudo

Além da questão técnica, existe um pano de fundo estrutural.

O Brasil ainda convive com:

  • Déficit habitacional de milhões de domicílios

  • Moradias precárias

  • Falta de infraestrutura básica em muitos empreendimentos

Esse cenário gera:

  • Pressa excessiva nos cronogramas

  • Redução de custos sem critério técnico

  • Troca de materiais por opções mais baratas

  • Justificativas clássicas como “não tinha verba” ou “o fornecedor mudou”

Resultado? Mais risco, mais erro e mais defeito escondido.


Afinal, quem é o responsável — técnica e legalmente?

Não existe um vilão único.

Responsabilidade da construtora

  • Responde por vícios e defeitos da obra, dentro dos prazos legais

  • A responsabilização exige provas técnicas, laudos e documentação

Responsabilidade do gestor (síndico, dono, fiscal)

Quando o gestor:

  • Não acompanha a execução

  • Aceita troca de materiais sem análise técnica

  • Ignora não conformidades

  • Autoriza “ajustes paliativos”

➡️ A negligência dele pesa — e muito.
Em alguns casos, essa omissão agrava a responsabilidade da construtora ou até dificulta ações futuras.

📌 A jurisprudência brasileira já reconhece que a ausência de fiscalização adequada pode gerar corresponsabilidade.


Então… obra ruim ou gestor negligente?

A resposta honesta é: muitas vezes, os dois.

Veja os cenários mais comuns:

  • Projeto falho + execução ruim = problema garantido

  • Projeto correto + execução falha = obra mal feita

  • Projeto e execução corretos + gestão inexistente = defeito por negligência

  • Vícios ocultos: defeitos que só aparecem com o tempo, exigindo investigação técnica

👉 Antes de apontar culpados ou entrar com ação, a perícia técnica é indispensável.


Como construir um argumento sólido (morador, síndico ou advogado)

Se a ideia é cobrar correção, se proteger legalmente ou evitar novos problemas, siga este roteiro:

1. Documente tudo

  • Fotos com data

  • Vídeos

  • Mensagens, e-mails e orçamentos

  • Registros de conversas

2. Faça uma vistoria técnica

  • Laudo de engenheiro ou arquiteto

  • Sem laudo, a prova fica fraca

3. Revise contratos e memoriais

  • O que foi prometido?

  • O que foi entregue?

  • Quais são os prazos e garantias?

4. Notifique formalmente

  • Cartas ou e-mails com protocolo

  • Solicite reparos com base técnica

5. Se houver resistência

  • Busque apoio técnico e jurídico

  • Muitas ações só avançam quando há prova de falha técnica ou omissão de gestão


Provocações para quem vive (ou gere) uma obra

  • Por que tantos síndicos ignoram pequenas não conformidades que viram grandes prejuízos?

  • Em que ponto a pressa do cronograma vira desculpa para atalhos técnicos?

  • Será que a obsessão pelo menor preço não está a alimentar uma indústria inteira de manutenção pós-venda?


Conclusão prática: o que fazer agora?

Para moradores

  • Ao primeiro sinal de problema, peça vistoria técnica

  • Guarde tudo

  • Não aceite “consertos paliativos” sem registro

Para síndicos e gestores

  • Exija cumprimento da NBR 15575 e do contrato

  • Documente aceitação de serviços

  • Recuse materiais sem ficha técnica

  • Faça acompanhamento fotográfico das etapas críticas:

    • Impermeabilização

    • Elétrica

    • Estrutura e fundação

 Gestão técnica não é custo — é prevenção de prejuízo.

 Quer entender melhor a NBR 15575 na prática?

Se você quer saber o que a Norma de Desempenho realmente exige, quais são os direitos do morador, as obrigações da construtora e como usar a NBR 15575 como ferramenta de cobrança técnica, recomendo a leitura do artigo abaixo: NBR 15575: O que é, pra que serve e porque é essencial na construção civil brasileira?

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