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PAPO DE OBRA
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| IMAGEM FICTICIA DE UM INCENDIO ( IA) |
Os incêndios em edificações representam uma das mais severas condições acidentais às quais uma estrutura pode ser submetida. A elevação súbita da temperatura, a perda de integridade dos materiais e o colapso parcial ou total da estrutura tornam os incêndios um fenômeno crítico tanto sob o ponto de vista da segurança das pessoas quanto da estabilidade estrutural.
No contexto da engenharia civil, as estruturas de concreto armado têm demonstrado melhor desempenho frente ao fogo quando comparadas a sistemas metálicos ou de madeira, graças à sua baixa condutividade térmica e maior massa térmica. Entretanto, essa resistência não é infinita. Temperaturas elevadas degradam o concreto e o aço, alteram suas propriedades mecânicas e podem levar ao colapso progressivo da estrutura.
Compreender o comportamento do concreto armado em situação de incêndio é essencial para projetistas, peritos e engenheiros de manutenção predial. Além de atender às normas de segurança contra incêndios, o conhecimento técnico sobre proteção passiva, ensaios pós-sinistro e recuperação estrutural é determinante para a tomada de decisões corretas após um evento térmico severo.
O concreto armado é um compósito formado pela associação de concreto simples (mistura de cimento Portland, agregados miúdos e graúdos, água e aditivos) com armaduras de aço estrategicamente posicionadas para resistir aos esforços de tração.
Concreto: resiste principalmente às tensões de compressão, sendo responsável pela forma e pela rigidez do elemento estrutural.
Aço: absorve as tensões de tração e flexão, garantindo ductilidade e capacidade de redistribuição de esforços.
Aderência aço-concreto: é o elo que permite a solidarização dos materiais. Em situações de incêndio, essa aderência pode ser severamente comprometida.
O cobrimento — camada de concreto que envolve as armaduras — desempenha papel essencial na proteção térmica do aço.
A NBR 15200:2012 estabelece espessuras mínimas de cobrimento conforme o tempo requerido de resistência ao fogo (TRRF) e o tipo de elemento estrutural.
“O cobrimento das armaduras deve ser suficiente para garantir a aderência e a proteção contra a corrosão e a ação do fogo.”
(ABNT NBR 15200:2012, item 6.2)
Um cobrimento insuficiente pode antecipar o aquecimento das barras de aço e levar à perda total da resistência antes que o incêndio seja controlado.
Durante um incêndio, as temperaturas podem ultrapassar 900 °C em poucos minutos. O concreto, apesar de não ser combustível, sofre dilatações térmicas, decomposição química e fissuração interna que comprometem sua integridade.
| Faixa de temperatura | Efeito principal | Consequência estrutural |
|---|---|---|
| 25–100 °C | Evaporação da água livre | Formação de microfissuras |
| 100–200 °C | Expansão da água capilar e adsorvida | Aumento da porosidade |
| 200–400 °C | Desidratação da pasta de cimento | Redução de resistência à compressão (≈25%) |
| 400–600 °C | Decomposição do hidróxido de cálcio (Ca(OH)₂) | Perda de coesão e fissuras profundas |
| 600–800 °C | Desintegração da matriz e expansão do aço | Spalling explosivo e colapso local |
| >800 °C | Fusão parcial da armadura | Colapso estrutural global |
O coeficiente de dilatação térmica do concreto é inferior ao do aço. Em altas temperaturas, essa diferença gera tensões internas que rompem a aderência entre os materiais.
O spalling é o desplacamento violento de fragmentos de concreto devido à pressão interna do vapor d’água. Esse fenômeno reduz o cobrimento e expõe as armaduras diretamente ao fogo.
Estudos indicam que o uso de microfibras de polipropileno pode reduzir significativamente o spalling, criando microcanais de escape para o vapor durante o aquecimento.
A segurança estrutural em situação de incêndio é regida por um conjunto de normas brasileiras que abordam desde o dimensionamento até os critérios de ensaio e desempenho.
| Norma | Título | Aplicação |
|---|---|---|
| NBR 15200:2012 | Projeto de estruturas de concreto em situação de incêndio | Dimensionamento e TRRF |
| NBR 14432:2021 | Exigências de resistência ao fogo de elementos construtivos | Classificação dos elementos e métodos de ensaio |
| NBR 8681:2021 | Ações e segurança nas estruturas | Define combinações de ações acidentais (incluindo fogo) |
| NBR 9077:2011 | Saídas de emergência em edifícios | Segurança de evacuação |
| NBR 13752:1996 | Perícias de engenharia | Avaliação pós-incêndio |
| IT 08 – CBM (Corpo de Bombeiros) | Resistência ao fogo de elementos estruturais | Critérios regionais complementares |
Essas normas devem ser aplicadas em conjunto com o Código de Segurança Contra Incêndio e Pânico de cada estado e com o Regulamento de Segurança Contra Incêndio do Corpo de Bombeiros Militar.
A classificação é fundamental para definir a resposta de combate e projetar os sistemas de proteção:
Classe A – Materiais sólidos comuns (madeira, papel, tecido).
Classe B – Líquidos inflamáveis (gasolina, tintas, solventes).
Classe C – Equipamentos elétricos energizados.
Classe D – Metais combustíveis (magnésio, alumínio, titânio).
Classe K – Óleos e gorduras (cozinhas industriais).
Cada classe requer agentes extintores e projetos de compartimentação específicos. No caso de estruturas de concreto, o maior risco está associado ao colapso decorrente de incêndios de classe A e B, que produzem calor sustentado e prolongado.
Tem como objetivo aumentar o tempo de resistência estrutural até o colapso (TRRF).
Principais métodos:
Aumento do cobrimento e uso de concretos de baixa permeabilidade;
Revestimentos protetores: argamassas projetadas, placas de gesso acartonado, tintas intumescentes e painéis cerâmicos;
Uso de concretos especiais, como concretos refratários e concretos com microfibras;
Setorização e compartimentação arquitetônica, que limitam a propagação do fogo.
Engloba os sistemas de detecção e combate: sprinklers automáticos, hidrantes, detectores de fumaça e alarmes visuais e sonoros.
Embora não protejam diretamente a estrutura, reduzem o tempo de exposição ao fogo, diminuindo o dano térmico.
A integração entre proteção passiva e ativa é uma exigência das normas modernas de segurança, sendo o único modo eficaz de garantir a estabilidade global durante incêndios prolongados.
Após o evento, a estrutura deve passar por vistoria técnica especializada conforme a NBR 13752:1996 – Perícias de Engenharia e a NBR 15575 – Desempenho das Edificações.
Inspeção preliminar: registro fotográfico, croquis e mapeamento de danos.
Ensaios não destrutivos: esclerometria, ultrassom, termografia e ferroscan.
Ensaios destrutivos complementares: extração de testemunhos para ensaios de compressão e carbonatação.
Modelagem estrutural: simulação numérica para estimar perda de rigidez e estabilidade.
Laudo técnico conclusivo: define se há viabilidade de recuperação ou demolição.
Recuperação é possível quando as armaduras mantêm aderência e o concreto não apresenta colapso estrutural.
Demolição é indicada quando há colapso parcial, deformações irreversíveis ou perda de estabilidade global.
Segundo Helene (2014), “a decisão entre recuperar ou demolir deve se basear em critérios técnicos e econômicos, jamais empíricos, considerando a segurança e o custo-benefício da intervenção.”
Quando tecnicamente viável, a recuperação envolve:
Remoção do concreto deteriorado e limpeza das armaduras;
Aplicação de passivadores e argamassas estruturais de alta aderência;
Reforço estrutural com fibras de carbono (CFRP), chapas metálicas ou adição de novas seções;
Reperfilamento das seções afetadas e novo cobrimento;
Ensaios de validação pós-reparo (ultrassom, carga e aderência).
O comportamento do concreto armado em situação de incêndio é um dos temas mais complexos e críticos da engenharia estrutural. Embora o concreto apresente desempenho superior a outros materiais em situação de incêndio, ele não é imune aos efeitos do calor extremo. A degradação térmica progressiva compromete sua coesão e pode levar à perda de capacidade estrutural e requer projeto cuidadoso, detalhamento correto e manutenção adequada.
Projetar e avaliar estruturas para resistir ao fogo é um dever técnico e ético do engenheiro. Cada detalhe — do cobrimento à compartimentação — pode significar a diferença entre a preservação da vida e o colapso estrutural.
O estudo contínuo, aliado à aplicação rigorosa das normas da ABNT e ao uso de tecnologias modernas de proteção e recuperação, é o caminho para edificações mais seguras, duráveis e resilientes.
ABNT NBR 15200:2012 – Projeto de estruturas de concreto em situação de incêndio.
ABNT NBR 14432:2021 – Exigências de resistência ao fogo de elementos construtivos de edificações.
ABNT NBR 8681:2021 – Ações e segurança nas estruturas.
ABNT NBR 13752:1996 – Perícias de engenharia.
HELENE, Paulo R. L. Concreto: Ensino, Pesquisa e Realizações. IBRACON, 2014.
SILVA, F. R. Estruturas de Concreto – Comportamento em Altas Temperaturas. PINI, 2020.
COSTA, A. M.; LOPES, J. S. Desempenho de Estruturas em Situação de Incêndio. Revista IPT, 2019.
IT 08 – Corpo de Bombeiros Militar de SP. Resistência ao Fogo de Elementos Estruturais, 2022.
🔍 O comportamento do concreto em incêndios é apenas uma parte do desempenho global das edificações.
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